O futuro do mundo e da Igreja passa através da família. A constatação, absolutamente verídica, pode ser encontrada na Exortação Apostólica Familiaris Consortio, do Papa João Paulo II. Ela explica a atenção especial que a Igreja dá à sociedade doméstica. Os problemas aumentam, em nossos dias, como resultado do ambiente que nos cerca e do enfraquecimento dos valores que servem de alicerce à sociedade. O tema questiona, sumamente, o homem na atualidade.
Uma das causas que geram todas as crises conjugais e, de modo particular, a separação dos pais e suas sequelas, é a deficiência na preparação ao matrimônio. Um contrato que, para nós, é elevado à dignidade de Sacramento, – e, conforme São Paulo, “grande sacramento” (Ef 5,32)– exige cuidadosa formação. Trata-se de uma opção definitiva e indissolúvel pela lei natural e divina. A ausência de um profundo conhecimento mútuo é motivo de desentendimento e introduz o germe da desagregação. Com a convivência percebe-se defeitos físicos, espirituais e de caráter até então ignorados. Muitas vezes a união conjugal fundamenta-se na paixão e esta decorre do instinto – o poderoso instinto que assegura a continuidade da espécie humana – ao passo que o amor é um ato oblativo e se fundamenta também na razão. Importa, portanto, identificar, em tempo oportuno, qual dos dois elementos move à decisão em assunto matrimonial.
Um outro fator é a pressão de uma sociedade que promove a busca do prazer e da felicidade pessoal a qualquer preço como um direito indiscutível, mesmo que, para alcançá-lo, atropele o outro cônjuge e a prole. Esse é um grande drama que foi estimulado pela introdução do divórcio. Dada a fraqueza humana, certamente todas as famílias, no decorrer da existência, terão problemas a superar. A tentação em resolvê-las com a separação leva, com frequência, à dissolução da vida em comum. Na atualidade, o indivíduo se esquece da importância da ascese, da necessidade de suportar os problemas que surgem no transcorrer da vida. No entanto, o sofrimento é instrumento válido e fecundo na formação do caráter e no exercício da paz na vida matrimonial. Ela expressa a união de Cristo com sua Igreja.
As ilusões propostas como verdades sólidas, fazem muitos acreditarem que o casamento é um oásis a ser usufruído. Ora, isso só ocorre, se for construído e defendido dia a dia. No momento em que se pensa apenas em desfrutá-lo e, por vezes, à margem dos valores morais, envereda-se pelo caminho que leva à destruição do lar.
Ouvem-se, hoje, comentários de que a Igreja é contrária à satisfação do instinto sexual, inclusive dentro do matrimônio. Não é verdade. A Doutrina cristã veda a relação sexual fora desse sacramento ou com a exclusão, por meios artificiais, de seu efeito reprodutivo. Em outras palavras, impedindo uma de suas finalidades. Esse ato deve estar aberto à vida. Cabe aos pais decidir sobre o número dos filhos, tomando também em consideração as possibilidades do que podem dispor para educá-los. E utilizando somente métodos naturais.
Em nossos dias cresce uma deficiência que afeta uma grave obrigação dos progenitores. Refiro-me à omissão dos pais em dar aos filhos uma educação segundo os preceitos cristãos. O clima, que direi de loucura, pela permissividade moral que se respira por toda parte, acovarda alguns pais e mães, diante das exigências audaciosas da prole. Os que assim procedem darão severas contas a Deus. Todo fiel, consciente de seus deveres, jamais permitirá algo que fira a sua consciência cristã. O “não” deverá ser envolvido pela bondade, que não se confunde com fraqueza ou ausência. A observância dos compromissos diante do Senhor, com a ajuda mútua dos esposos na educação dos filhos, mesmo que não obtenha resultados positivos, muito ajudará a criar ou manter um ambiente de paz, que vem de Deus. A falha nessa matéria gera muitos outros problemas, que levam à crise no lar.
Evidentemente, a construção constante da estrutura familiar necessita do fator religioso, a começar pelo exemplo. O ensino dos encargos oriundos do Evangelho, a oração, e, em especial, o terço em família, são fontes inesgotáveis de bênçãos para todos e cada um. A observância do Dia do Senhor, o Domingo, se constitui elemento importante na edificação de uma família feliz. A Missa dominical, se possível unindo todos os integrantes da comunidade doméstica, se torna poderoso elemento de louvor e ação de graças ao Senhor. O mesmo se diga da leitura frequente da Palavra divina, a Bíblia. Sem dúvida, posso assegurar que aí está um pára-raios contra as borrascas no lar e uma fonte abundante de bênçãos para a família.
Na Exortação Apostólica “Ecclesia in America”, fruto da IV Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano, ao tratar dos desafios para a Família cristã, assim se exprime o Santo Padre: “É urgente, portanto, uma ampla obra de catequese acerca do ideal cristão da comunhão conjugal e da vida familiar que inclui uma espiritualidade da paternidade e da maternidade. Maior atenção pastoral vai dirigida ao papel dos homens, como maridos e como pais (…) tampouco se omita uma séria preparação dos jovens, antes do casamento” (nº 46).
A saúde espiritual e moral da família é um assunto fundamental para a sociedade civil e religiosa. Merece todo sacrifício em sua defesa e promoção. Não nos faltará a graça de Deus e o amparo da Sagrada Família.
Fonte: Dom Eugenio de Araujo Sales – Cardeal Arcebispo Emérito do Rio de Janeiro