O agravamento dos conflitos na Síria e no Iraque em nome do Califado Islâmico, com episódios de particular brutalidade, mas também um crescendo de violência em países africanos como a Nigéria contra aqueles que não se reconhecem na sharia. A gente se pergunta diante da dramática expansão da ideologia extremista islâmica. Fausta Speranza falou com o padre jesuíta egípcio Samir Khalil Samir, professor de história da cultura árabe e estudos islâmicos na Universidade Saint Joseph de Beirute:
Hoje, o problema é político. A guerra na Síria, no início, era uma guerra dos sírios que protestavam contra um regime ditatorial; mas muito cedo – já dois meses mais tarde – apareceram pessoas de todo o mundo islâmico, e em particular da Península Arábica, para fazer a guerra porque eram xiitas e alauitas os que que governavam. O problema, portanto, é interno ao Islão no início, porque tem uma coisa que sempre volta, o facto dogmático de dizer: “Quem não pertence à autenticidade islâmica deve ser eliminado”, o “kafir”. “Kafir” era uma palavra que se aplicava aos não-crentes em Deus, mas foi ampliada; e declarar o outro “kafir” – em árabe se diz “takfir” – é um dos flagelos do Islão moderno, ou seja, o facto de dizer que o outro não é um autêntico muçulmano e deve ser eliminado.
Mas como explicar este acentuar-se da exasperação do fundamentalismo, do extremismo deste pensamento islâmico? Digamos que de alguma forma, na falta de um processo cultural, houve este ressurgimento da violência, do desejo de poder?
Sim! Cultural e político. A crise é generalizada: existe a pobreza, existe a ignorância … da mesma forma que há uma crise da civilização no Ocidente, que, porém, toma a forma de um neopaganismo … mas é um outro problema.
Hoje, talvez, é também uma época que está a passar por um momento baixo de humanidade: precisaríamos realmente de um novo humanismo …
Sim, nós agora atingimos a bestialidade mais feroz na história do Islão. Nunca chegámos a este ponto de barbárie. A pergunta é: é isto é o Islão? Ou é um desvio? Certamente tem a sua origem na tradição islâmica. Mas, por outro lado, certamente não se pode dizer que o Islão é isto. Ou seja, é uma derivação do Islão: eles pensam de realizar o “califado”, a época famosa do século IX-X ao séc. XIII, e é um erro. Muitos muçulmanos o dizem e repetem; os grandes pensadores são contrários. O drama é que os muçulmanos não se atrevem a fazer autocrítica: isto é, o povo segue em silêncio. Não vi o que também o Comité para o Diálogo Inter-religioso do Vaticano, no seu documento, na página que escreveu na terça-feira 12 de agosto, diz: há coisas inadmissíveis! Citam 11 pontos contrários aos direitos humanos, e se exprime em termos muito fortes! É o documento mais claro que eu conheço, que não faz uso de expressões diplomáticas: muito equilibrada, mas forte. E diz: até quando permanecereis em silêncio? Que os Imames falem! E não apenas os Imames: a multidão, o povo muçulmano vai às ruas quando se trata de uma “coisinha” política dos outros, contra os outros; mas quando se trata de questões islâmicas, acha que não é bom, mas nem por isso vai às ruas.
Qual pode ser o caminho para sair de tudo isto?
Uma colaboração com o mundo ocidental; ajudá-los a dar um passo em direção a uma visão universalista. Por exemplo, quais são os direitos humanos? Se pudéssemos aplicá-la realmente, seria já uma maravilha! Creio que se pode fazer, mas deve-se proceder – para usar um termo espiritual – a uma conversão tanto no Ocidente, como no mundo islâmico. No Ocidente, para ser menos materialista, porque o que impulsiona todo o sistema é o dinheiro, o poder, o domínio. Uma visão comum, humanista – serão necessárias décadas para se chegar até lá…
Fonte: Rádio Vaticano